Diagnóstico tardio de câncer de mama leva 70% dos casos à mastectomia
A Sociedade Brasileira
de Mastologia (SBM) alerta que em 70% dos casos de câncer de mama
diagnosticados no país a mulher passa por uma mastectomia (remoção total
da mama). O principal motivo é que a doença é identificada em estágio
avançado.
Para a sociedade, esse índice está ligado à dificuldade do
diagnóstico precoce e demora ao acesso a consultas, exames, biópsia e
tratamento.
Pesquisas internacionais apontam que se o tumor é descoberto logo no
início, ou seja, com menos de 2 centímetros, as chances de cura podem
chegar a 95%, conforme a sociedade.
“Isso é um problema muito ligado à questão econômica com dois
problemas básicos: a disponibilidade dos recursos, dos exames, a
qualidade dos equipamentos e dos resultados. A limitação do acesso é um
problema muito sério no nosso país, as mulheres no Sistema Único de
Saúde (SUS), passam por uma verdadeira 'via crucis' que é conseguir
consulta num posto de saúde, conseguir um pedido de exame e depois
realizá-lo. Com o diagnóstico tardio, a agressividade do tratamento é
maior”, disse o presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia,
Antônio Frasson.
Para Frasson, a queda na busca pelos exames está relacionada também
ao fato de muitos brasileiros estarem sem emprego ou terem perdido a
cobertura de plano de saúde.
“Quando a gente observa o número de mulheres que vem fazendo exames,
esse número, em vez de aumentar, vem caindo. Isso é muito ligado à
questão econômica, questão da falta de recursos, estamos falando isso no
sistema público e no sistema privado. Com a crise, muita gente perdeu o
acesso, o convênio”.
De acordo com o Ministério da Saúde, estados e municípios têm
autonomia para organizar a rede de atendimento "e o tempo para realizar
diagnóstico depende da organização e regulação desses serviços".
"Em 2017, foram realizados no SUS 4,04 milhões de mamografias de
rastreamento, sendo 2,6 milhões na faixa etária prioritária preconizada
pela Organização Mundial da Saúde, que são mulheres de 50 a 69 anos.
Além disso, também houve aumento de 100% dos valores repassados para
exames essenciais para o diagnóstico e para a decisão médica do
tratamento dessa doença".
Conforme a pasta, o repasse de recursos federais para tratamento passou de R$ 2,2 bilhões em 2010 para R$ 4,6 bilhões em 2017.
Com intuito de preservar as mamas, médicos têm adotado técnicas que
permitem, por meio de um acesso pequeno (pela borda da aréola e mamilo
ou pelo sulco mamário) fazer a retirada dos tumores, com menor risco de
complicações e melhores resultados estéticos.
De acordo com o mastologista, incisões escondidas podem ser feitas na
retirada total da mama ou quando é retirado somente o tumor com margem
livre. Esse tipo de cirurgia evita que a mulher tenha o estigma de uma
cirurgia radical, com cicatrizes no meio do seio.
“A pessoa faz cirurgia, e pode fazer radioterapia, quimioterapia ou
hormonioterapia. A associação das múltiplas terapias faz com que um
tratamento exclusivo seja menos utilizado e isso ajuda muito no avanço
das técnicas cirúrgicas, fazendo com que o tratamento cirúrgico passe
praticamente desapercebido”.
Durantete a Jornada Brasileira de Oncoplástica, ocorrida em São Paulo
no mês passado, profissionais da área focaram na qualificação de
técnicas cirúrgicas de reconstrução mamária.
“Durante o evento, especialistas internacionais e nacionais
realizaram as cirurgias em um hospital e as imagens foram transmitidas
ao vivo para uma plateia de médicos que puderam participar discutindo as
melhores opções”, disse Frasson.
A dona de casa Ruth Pereira Waiteman foi uma das pacientes. Há dois
anos, ela passou pela mastectomia da mama esquerda, em seguida, colocou a
prótese, fez quimioterapia e radioterapia. Após a retirada, surgiram
nódulos na mama direta, o que a levou a retirar a glândula mamária
direita. A reconstrução das duas mamas, segundo ela, foi um presente de
aniversário, ao ter sido feita no dia 20 de abril, quando completou 65
anos. “Fiz a reconstrução porque acho que ainda me sinto nova, sou ativa
e isso fez muito bem. Não é totalmente pela estética, mas é pelo meu
conforto e meu bem-estar. Sinto que fechei um ciclo, foi um presente".
Enquanto Ruth comemora, muitas mulheres ainda esperam pela cirurgia
de reconstrução, como a faxineira Aparecida de Fátima de Souza Augusto,
de 49 anos.
Em 2016, ela passou por uma mastectomia do seio esquerdo, no
Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Rio de Janeiro. Desde outubro do
ano passado, está apta para a reconstrução, mas o procedimento deve
levar ainda pelo menos dois anos para ocorrer. “Já estou livre do
câncer, fui bem tratada no Inca, mas acho que demora muito. Daqui a dois
anos ainda, é muito tempo, poderia ser mais ágil”, lamenta.
Embora
já tenha se acostumado com a situação, passar pela reconstrução será
importante para auto estima. “Hoje já estou mais acostumada a não ter o
seio, mas acho muito difícil”.
A lei que prevê reconstrução
mamária imediatamente após mastectomia completou cinco anos em abril. A
Lei 12.802 prevê que pacientes submetidas a mastectomia têm o direito de
realizar a reconstrução mamária por meio do Sistema Único de Saúde
(SUS) imediatamente após a retirada do tumor. A SBM afirma que apenas
20% das 92,5 mil mulheres que retiraram as mamas entre os anos de 2008 e
2015 passaram pelo procedimento de reconstrução. De acordo com a
instituição, a reconstrução mamária imediata é viável em cerca de 90%
dos casos.
Em nota, o Ministério da Saúde informou que "segundo a
mesma lei, quando não houver indicação clínica para realização dos dois
procedimentos ao mesmo tempo, a paciente será encaminhada para
acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia após alcançar
as condições clínicas necessárias. Sendo assim, cabe à equipe médica
responsável pela paciente avaliar se é possível realizar os dois
procedimentos no mesmo ato cirúrgico.
A decisão é tomada com base
em diversos fatores, como a condição da área afetada para evitar
infecção ou rejeição da prótese e a vontade da própria paciente. Em
alguns casos, é necessária a radioterapia ou quimioterapia antes da
reconstrução mamária ser realizada".
Conforme o ministério, em
2013, foram feitas 11.931 cirurgias de mastectomia e 3.411 de
reconstrução mamária no SUS. Em 2017, dados preliminares, foram 10.186
mastectomias e 3.413 reconstruções mamárias. Os investimentos federais
para a reconstrução mamária passaram de R$ 2,21 milhões, em 2013, para
R$ 2,39 milhões no ano passado.
Há também desconhecimento das
mulheres sobre a legislação. Pesquisa da Federação Brasileira de
Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), em
parceria com o Hospital Moinhos de Vento, de Porto Alegre (RS), a
Johnson & Johnson Medical Devices e o instituto Ideafix mostrou que
de 468 mulheres entrevistadas apenas 27,6% disseram conhecer bem a lei.
Conforme a pesquisa, 74,8% das entrevistadas que trataram o câncer no
sistema privado fizeram a cirurgia de reconstrução mamária e 53,4% das
pacientes do sistema público passaram pelo procedimento.
“Imediata
ou não, a cirurgia de reconstrução é um direito de toda paciente de
câncer de mama que passou por mastectomia durante o tratamento da
doença. Esse direito deve ser exigido junto ao SUS e aos planos de saúde
e discutido com o médico antes da realização da cirurgia ou a qualquer
momento após o procedimento de retirada do tumor, no caso de uma
reconstrução tardia”, disse a presidente da Femama, Maira Caleff.
Nenhum comentário
Deixe aqui o seu comentário!