Governo decreta sigilo sobre estudos que embasam reforma da Previdência
O Ministério da Economia decretou sigilo
sobre estudos e pareceres técnicos que embasaram a PEC (Proposta de Emenda à
Constituição) da Previdência. Assim, não é possível ao cidadão comum,
afetado diretamente pelas mudanças em pensões e aposentadorias, ter acesso
a argumentos, estatísticas, dados econômicos e sociais que sustentam o texto em
tramitação. A decisão de blindar foi formulado com base na Lei de Acesso à Informação após o
envio da PEC ao Congresso.
Na resposta, a Secretaria Especial de
Previdência e Trabalho informou ter elaborado, “no âmbito de suas
competências regimentais”, manifestações técnicas sobre a proposta em
tramitação.
“Contudo, registra-se que todos os expedientes
foram classificados com nível de acesso restrito por se tratarem de documentos
preparatórios”, explicou.
Na prática, isso significa que só servidores e
autoridades públicas, devidamente autorizados, podem acessar as informações.
A resistência do governo em apresentar
levantamentos relativos à PEC tem irritado congressistas.
O decreto que regulamenta a Lei de Acesso chama de
preparatórios documentos formais usados como fundamento de “tomada de decisão
ou de ato administrativo, a exemplo de pareceres e notas técnicas”.
A secretaria diz que a medida restritiva segue
entendimento da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) a respeito do
assunto.
A PEC já foi editada e apresentada pelo governo ao
Congresso em fevereiro. Desde então, aguarda apreciação pela CCJ (Comissão de
Constituição e Justiça) na Câmara.
O governo tentou, sem sucesso, votá-la na quarta
(17). O tema será retomado na próxima semana.
“Não será possível a liberação dos documentos
solicitados”, informou a secretaria ao jornal, sob alegação de que a PEC “ainda
se encontra em fase inicial de tramitação no Congresso”.
Na avaliação de Manoel Galdino, diretor-executivo
da Transparência Brasil, entidade sem fins lucrativos que milita pelo controle
social do poder público, o governo fere a legislação ao classificar os estudos
com acesso restrito. Segundo ele, não há hipótese legal para impor
sigilo em documentos preparatórios.
Galdino questiona ainda o fato de o governo afirmar
que os pareceres são preparatórios.
“Se tivesse negado a informação antes de apresentar
a reforma ao Congresso, faria sentido dizer isso. A proposta já foi enviada, o
que mais a gente precisa esperar? O cidadão tem direito de saber quais foram os
fundamentos que embasaram uma proposta que já está em debate público”,
argumenta.
Galdino integra o Conselho de Transparência Pública
e Combate à Corrupção da CGU (Controladoria-Geral da União). O colegiado,
formado por integrantes da sociedade civil e do Executivo, é uma instância
consultiva sobre a Lei de Acesso e acompanha sua execução. A própria minuta da
lei, aprovada em 2011, foi rascunhada pelo grupo.
Na fase de elaboração da proposta que endurece as
regras da aposentadoria, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o
secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, se recusaram a
abrir as informações do projeto sob o argumento de que todos os dados seriam
apresentados ao Congresso, por respeito aos parlamentares.
Porém, mesmo após a apresentação da PEC ao
Legislativo, críticas de parlamentares sobre falta de transparência do governo
persistiram.
Embora comande uma bancada com elevado índice de
apoio à reforma, o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), disse que faltam dados para
alimentar o debate e cobrou que a equipe econômica seja mais transparente.
Na conturbada audiência pública na Câmara com a
presença de Paulo Guedes, que terminou em confusão e bate-boca no início do
mês, críticas se repetiram.
A deputada Clarissa Garotinho (Pros-RJ), por
exemplo, reclamou da falta de informações na apresentação do ministro aos
parlamentares. Depois de fazer uma série de perguntas, voltou a se queixar de
que Guedes deu poucos esclarecimentos e apresentou uma resposta por escrito
incompleta. Ela disse que faria um requerimento formal de informação ao
governo.
Um dos pontos mantidos em segredo pela equipe
econômica é o detalhamento do valor do impacto fiscal de cada item proposto na
reforma da Previdência. O governo afirma que o projeto gera uma economia de
aproximadamente R$ 1 trilhão em dez anos, mas vem se negando a abrir o cálculo
desse valor a parlamentares e à imprensa.
Congressistas questionam, por exemplo, qual seria o
impacto de eventual supressão dos trechos da PEC que promovem mudanças
em aposentadorias rurais e nos benefícios pagos a idosos em
situação de miséria. Os dois pontos têm chances de retirada da proposta, com
aval de aliados do governo.
A informação poderia ser esclarecida com o acesso
aos estudos elaborados pelo Ministério da Economia, agora classificados como de
acesso restrito.
Em março, em outra medida para restringir
informações nessa seara, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) emitiu
uma circular desautorizando seus funcionários a se manifestar à imprensa sobre
a reforma da Previdência. Entidades civis criticaram a medida.
No ofício, direcionado a diretores, gerentes e
auditores, o órgão argumentou que esclarecimentos sobre o tema devem ser dados
pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia.
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