Aguinaldo e mais 31 parlamentares têm biografias alteradas na internet para esconder escândalos
Votos polêmicos suprimidos, escândalos ocultados, e elogios. O GLOBO identificou ao menos 32 políticos, deputados e senadores, que tiveram suas páginas alteradas. A lista de mudanças feitas por parlamentares (27 deles candidatos nestas eleições) é extensa nas páginas do Wikipédia, enciclopédia online referência nos buscadores da internet. Entre os nomes listados, constam os dos senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA) e Hélio José (PROS-DF), além dos deputados Carlos Zarattini (PT-SP), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Herculano Passos (MDB-SP). Todos disputam um novo mandato.
A maioria das publicações parte de computadores ligados à
rede da Câmara e do Senado. Num dos IPs identificado como de número
200.219.132.70, oriundo da Câmara dos Deputados, retirou da página de
Zarattini trechos críticos a um projeto de lei proposto pelo
parlamentar, referente à regularização de transporte de passageiros via
aplicativos como Uber. No trecho retirado, argumentava-se que a PL 5587
acabaria com a “lógica das empresas”. Posteriormente, o texto original
foi recuperado.
Analisando o histórico da página de Zarattini é possível
verificar mais alterações nesse sentido. No dia 17 de abril, o usuário
“Castro vanessa38” retirou um parágrafo sobre um escândalo em que a
esposa de Zarattini, Maria Aparecida Perez, se envolveu durante a gestão
de Marta Suplicy na prefeitura de São Paulo. Condenada por improbidade
administrativa, ela firmou contrato sem licitação junto a Fundação
Getúlio Vargas quando foi secretária da Educação. O usuário que fez a
mudança tem nome parecido com o de uma assessora de Zarattini: Vanessa
Castro.
— Se houve alteração da nossa parte, foi no início do ano.
Mas a gente segue olhando as mudanças, porque qualquer pessoa pode
mexer. Além disso, as páginas de parlamentares são alteradas
frequentemente, para atualizar projetos aprovados por eles — justificou
Vanessa Castro, que não confirmou ser a responsável pelo perfil “Castro
vanessa38”.
O trecho acabou recuperado por outro usuário. No entanto,
no dia 10 de agosto, um usuário de nome Wilberty extirpou do texto o
segmento “Escândalos Pré 2018”, que incluía o caso da esposa do
deputado. No trecho, contavam-se casos de corrupção em que Zarattini
esteve envolvido, como quando sofreu denúncias por ter feito repasses
ilegais para empresas de ônibus, durante sua gestão como secretário de
transportes de Marta Suplicy. Na própria Wikipedia, Wilberty explicou
que cortou trecho porque ele carecia de “apoio de fontes confiáveis”.
Não é possível saber o IP de Wilberty, pois a Wikipedia protege
informações de usuários cadastrados.
ESCÂNDALOS DE SENADORES FORAM DELETADOS
O senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) teve sua página editada
no dia 17 de maio, por um computador da rede do Senado. O autor da
modificação retirou trechos mencionando a prisão temporária do político
durante a Operação Pororoca, em 2004, quando ele era suplente do então
senador Duciomar Costa. Na página de Flexa Ribeiro, também foi
adicionado um segmento sobre o “reconhecimento nacional” supostamente
conquistado por ele. Editores da Wikipédia classificaram a ação como
suspeita e restauraram o trecho sobre a prisão. No entanto, os elogios
seguem disponíveis até hoje: a página diz que o senador “luta pela
melhoria da qualidade de vida de seu povo”. A assessoria de Flexa
Ribeiro não se manifestou.
Da página do senador e atualmente candidato a deputado
federal Hélio José (PROS-DF) foi retirada, no dia 19 de março deste ano,
parte da transcrição de um áudio vazado em que ele disse: “Isso aqui é
nosso. Isso aqui eu ponho quem eu quiser, a melancia que eu quiser aqui,
vou colocar”, revelado pelo GLOBO. Na ocasião, o parlamentar defendia a
indicação de um ex-assessor para o cargo de superintendente da
Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Uma assessora do parlamentar
disse à reportagem que desconhece a procedência da edição na plataforma e
disse que iria apurar se ela teria partido de outros membros da equipe
do gabinete.
VOTOS POLÊMICOS DE DEPUTADOS SUMIRAM
Em comum, vários IPs da Câmara e do Senado retiraram
menções a votações tidas como impopulares das páginas dos parlamentares.
É caso de Flexa Ribeiro, que teve as referências aos seus votos a favor
da Pec do Tetos dos Gastos Públicos e da Reforma Trabalhista limadas.
Junto foi embora o trecho que menciona sua posição contrária à cassação
do mandato do senador Aécio Neves. No entanto, horas depois, um usuário
restaurou o texto a sua forma original e escreveu: “recolocando itens
removidos na “atualização de dados” feito pelo ip do senado Brasileiro
(ainda mais que este ano tem eleição)”.
As páginas dos deputados Tenente Lúcio (PR-MG), Herculano Passos
(MDB-SP) e Márcio Marinho (PRB-BA) também foram alteradas. Informações
sobre votações polêmicas da Câmara foram retiradas do site, também a
partir da rede de computadores da Casa Legislativa. No caso de Lúcio, as
mudanças foram feitas por um usuário chamado “Weltonneves”, que é o
mesmo nome de um dos secretários parlamentares que trabalham com o
deputado. Foram ocultadas as posições pró-Reformas Trabalhista e da
Previdência e o voto contrário à abertura de investigação do presidente
Michel Temer por obstrução de justiça e organização criminosa. Um
assessor disse ao GLOBO que tem conhecimento de apenas uma atualização
sobre a trajetória pública do político, que concorre à reeleição.
O caso de Tenente Lúcio é semelhante ao de Herculano
Passos. No caso do político paulista, as mesmas informações foram
deletadas: os votos positivos dele sobre as Reformas e negativo sobre a
investigação de Temer sumiram. Uma assessora de comunicação reconheceu
que o gabinete tentou incluir um texto “mais coerente com as posições do
deputado”, mas afirmou que a tentativa não teria sido bem-sucedida. Ela
também sustentou que Passos sustenta as próprias opiniões e não teria
motivos para apagá-las da Internet. Curiosamente, um usuário chamado
“HerculanoP” está entre os principais autores de modificações na página e
até utilizou a plataforma para corrigir um possível ato falho: em um
trecho escrito anteriormente em primeira pessoa, alterou para a terceira
pessoa. Onde estava escrito “em meu primeiro mandato” passou a constar
“em seu primeiro mandato”.
No dia 3 de maio, um IP da Câmara editou a página do
parlamentar Aguinaldo Ribeiro (PP), líder do governo. Foram suprimidos
trechos referentes a Operação Lava Jato, em que Ribeiro foi acusado pelo
doleiro Alberto Youssef de se beneficiar do esquema de propinas. O
trecho depois foi recuperado por um usuário.
O deputado baiano Márcio Marinho também teve sua página
editada de dentro da Câmara. O assessor Henrique Araújo admitiu ter
feito alterações para atualizar o currículo do candidato, mas nega ter
retirado votações polêmicas. No entanto, foram adicionados trechos que
copiam a biografia do deputado disponível em seu site oficial. A página
sofreu diversas alterações de IPs da Câmara e um da Bahia, estado do
deputado. Em uma delas, foi retirada o posicionamento em votações
polêmicas. Posteriormente, o trecho foi restaurado por usuários.
A reportagem é uma produção do blog #FocaNoVoto, formado
por estagiários do GLOBO para a cobertura das eleições deste ano, com
olhar de quem está atento às redes sociais e aos anseios do público
jovem. Mais de 15 jovens contribuem com a página, que é supervisionada
por editores do jornal.
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